Nova York, EUA - Era uma sexta-feira, 13 de julho, Dia Mundial do Rock. Um senhor de barba branca, vestindo xadrez e chapéu de couro subiu ao palco do Midsummer Night Swing, um festival de música e ritmos que aconteceu no Damrosh Park, no Lincoln Center, no coração de Nova York. Sem cerimônias, pegou o microfone e, com a energia de um roqueiro, cantou, dançou, pulou, gingou por todo o palco e levou os novaiorquinos ao delírio, tocando músicas de Jackson do Pandeiro e Luiz Gonzaga. Era Biliu de Campina, que, aos 63 anos, teve o mais importante reconhecimento público de sua carreira, ao ser ovacionado em um dos espaços mais cobiçados da música mundial e ter sua arte enaltecida inclusive no The New York Times.
“Confesso que nessa idade não esperava me surpreender mais com nada, mas hoje fiquei emocionado ao ver aquele público maravilhoso dançando e até tentando cantar as músicas”, disse Biliu ao término do show. Cumprimentado por todos que o via passar, posando para fotografias, distribuindo um autógrafo aqui e ali, concedendo entrevistas para jornalistas americanos, o músico sentiu que a valorização do forró tradicional vai além das fronteiras do Brasil.
“O blues e o jazz americano é feito de improviso e provamos também que o forró, além do improviso, é feito com espontaneidade. Mas me refiro aqui ao forró de qualidade, não esse forró que é produto”, disse.
O convite para viajar para a América partiu do produtor cultural pernambucano Paulo André, criador do festival Abril Pró Rock. “Já tinha levado o Biliu para tocar em Amsterdam, na Holanda, e tinha essa ideia de promover um encontro com os mestres do forró nordestino. Então lancei a proposta para a produção do Midsummer Night Swing que aceitou de imediato”, comentou Paulo André, acrescentando que já estuda a possibilidade de realizar novos shows dos mestres do forró em outros países.
A sexta foi reservada para os artistas brasileiros. Além de Biliu, se apresentaram os pernambucanos Maciel Melo, Walmir Silva e o Quarteto Olinda. O paraibano foi o segundo a subir ao palco e de imediato lançou uma sequência de clássicos de Jackson do Pandeiro. Depois foi a vez de fazer as devidas homenagens a Luiz Gonzaga, colocando todo o público para dançar ao som de músicas como “Paraíba”.
Biliu mostrou toda a sua irreverência ao dançar xaxado e forró no palco e ao instigar o público a cantar as letras em português, conseguindo fazer os gringos arriscarem em voz alta o refrão de “Sebastiana”: “a, e, i, o, u, ipsilone”. “Achei fantástica essa parte do show. Me emocionei quando vi aquela gringalhada toda acompanhando, mesmo sem fazer a pronúncia correta. E me surpreendi também vendo eles dançando até quadrilha”, sorriu Biliu.
O festival começou no dia 26 de junho e encerrou sábado e cada dia foi dedicado a um estilo diferente. O público é incentivado e chegar uma hora antes de cada show para ensaiar com instrutores de dança profissionais. Eles ensinam os passos, as variações e tudo que o público precisa saber sobre determinado estilo, com demonstrações práticas. Dessa forma, quando começa o show, a pista de dança na frente do palco fica completamente lotada. Na sexta, o que se viu foram novaiorquinos arrastando o pé sem parar.
De acordo com o diretor geral do evento, Bill Bragin, ter os mestres do forró foi uma honra. “Sempre gostei do forró, do seu ritmo, do seu balanço, que se difere dos demais ritmos da música popular brasileira. Sempre acompanhei o movimento musical de Pernambuco, desde o Chico Science, Cascabulho. Então foi um enorme prazer ter no nosso palco os mestres do forró que representam diferentes gerações”, comentou Bragin, que também caiu no forró durante os shows.
Antes do show, a organização fez uma considerável explanação sobre o que é o forró, suas características, representantes e lembrou a vida e a obra de Luiz Gonzaga. “A coisa aqui é levada a sério. Eles valorizam mesmo o que é tradição, o que é cultural. Uma pena que isso não aconteça em todos os lugares”, lamentou Biliu de Campina, que, mesmo com seu nome, não toca em Campina há mais de dois anos. Ultimamente o músico tem se apresentado apenas em cidades do interior da Paraíba e em Pernambuco. Mas agora mostrou que não é apenas o Biliu de Campina, mas também o Biliu de Nova York, o Biliu do Mundo.
Brasil e EUA no mesmo ritmo
O público brasileiro também compareceu ao show dos mestres do forró. A campinense Bergma Asfóra, filha do tribuno e político Raymundo Asfóra, mora no estado vizinho de Nova Jersey, mas quando soube do show de Biliu não pensou duas vezes.
“Não poderia perder esse show por nada. Sempre gostei do Biliu, que além de ser um excelente músico, representa com fidelidade as minhas raízes”, comentou ela, que mora nos EUA há 11 anos. “Para nós foi uma forma de brincar o São João, mesmo que um pouco atrasado”.
A artista plástica Yara Reid, que é de João Pessoa e conhece Biliu pessoalmente, mora em São Francisco, na Califórnia, e não mediu esforços para assistir o show. Ela estava viajando com o esposo e o filho pelo país quando soube que Biliu estaria em Nova York: mudou o roteiro e incluiu Manhattan no itinerário. “O show foi maravilhoso e rever o Biliu melhor ainda. Adorei também o Maciel Melo e o Walmir Silva”, falou, entusiasmada.
Mas o grande público foi formado por americanos, como a novaiorquina Linda Morales, do Brooklyn. Ela assistiu a maior parte do show em frente ao palco, dançando sem parar e boquiaberta com a performance de Biliu. Confessou que nunca tinha escutado forró, mas que sempre gostou da música brasileira, principalmente do samba. “Fiquei completamente fascinada por esse ritmo. É envolvente e não consigo parar de dançar”, disse.
Questionada se tinha achado o ritmo estranho em comparação ao estilos musicais americanos ao quais está mais familiarizada, Linda brincou: “Eu sou de Nova York, nasci e vivi aqui toda minha vida, então asseguro que quase nada pra mim é estranho”, sorriu.
SAOBENTOAGORAPB Com Jorge Barbosa especial para o Correio
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